terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Jarro, copos e jarra - OAL | Olaria de Alcobaça

A Olaria de Alcobaça Lda. nasce em 1927, fundada por Silvino da Bernarda que deixa a fábrica de cerâmica Raul da Bernarda, gerida por seu pai Manuel Ferreira da Bernarda, juntando-se a António Vieira Natividade (1896-?) e Joaquim Vieira de Natividade (1899-1968) na criação de uma nova unidade fabril.
A Olaria instalou-se na Rua Costa Veiga em Alcobaça e durante o primeiro ano de laboração a sua produção foi de cerca de uma fornada mensal. Nos primeiros tempos a OAL desenvolve uma gramática decorativa baseada em motivos típicos da produção nacional dos séculos anteriores, conjugando-os de forma inovadora. Inventa uma linguagem própria contribuindo para a criação da identidade daquela que mais tarde vem a ser conhecida como louça artística de Alcobaça.
Em 1935, coze a centésima fornada de loiça, contando-se já a existência de cinco marcas diferentes desde a sua fundação. Em 1940, ano em que realiza a duocentésima fornada, a OAL regista em cerâmica acontecimentos marcantes, como a Exposição do Mundo Português e as Comemorações do Duplo Centenário, perfeitamente alinhada com gosto vigente durante o Estado Novo.
Embora durante as décadas de 30 e 40, tenha aberto a sua produção a peças de cariz mais popular e às tendências Art Déco, será após a Segunda Guerra Mundial que se modernizará estilisticamente, cedendo às influências internacionais.
Em 1953, Luis Ferreira da Silva (n.1928) passa pela Olaria trabalhando como pintor, é aqui que enceta as primeiras experiências de ruptura com a produção tradicional da região. Nesta época começa também a fazer-se sentir em Alcobaça a renovação da linguagem decorativa proposta nas Caldas da Rainha pela SECLA, em especial pelo trabalho da artista húngara Hansi Staël (1913-1961), então na direcção artística da fábrica. Uma aparente espontaneidade do traço, conjugada com motivos abstractos de geometria livre e cores luminosas, faz-se notar nas decorações criadas por Staël para a produção corrente da SECLA. Alguns exemplares deste tipo de decoração já foram mostrados aqui e aqui.



OAL | Olaria de Alcobaça - conjunto de jarro e copos, Anos 60. © CMP



OAL | Olaria de Alcobaça - conjunto de jarro e copos, Anos 60. © CMP


O conjunto de jarro e copos agora apresentado terá sido produzido pela OAL durante a década de 60, sendo um bom exemplo da abertura da produção de Alcobaça às tendências e mercado internacionais. 
Estas peças em faiança, de formato tronco-cónico invertido, com o exterior vidrado a branco leitoso e riscado verticalmente a lápis cerâmico, foram produzidas em conjuntos compostos por varias unidades, cujos interiores são vidrados com diversas cores planas e vivas. 
As decorações com lápis cerâmico são pouco comuns na produção portuguesa desta época, aparecem por influência italiana, sobretudo em algumas fábricas da região de Alcobaça, como é o caso da Raul da Bernarda que, durante os Anos 50 e 60, fabrica vários modelos muito próximos da produção italiana da região do Sesto Fiorentino. 
Este tipo de produção satisfaz um mercado mais jovem, ansioso por peças de desenho moderno, funcionais e de baixo custo, adaptando-se facilmente às necessidades quotidianas.



OAL | Olaria de Alcobaça - conjunto de jarro e copos, Anos 60. © CMP



OAL | Olaria de Alcobaça - conjunto de jarro e copos, tardoz. © CMP



OAL | Olaria de Alcobaça - copo, tardoz. © CMP


OAL | Olaria de Alcobaça - copo, tardoz. © Sílvia Jardim


Estas peças, embora relativamente vulgares, já que foram produzidas em larga escala, raramente aparecem com a marca de fábrica. O que se justifica pelo facto de terem sido em muitos casos fabricadas para serem distribuídas como brindes de marcas de produtos alimentícios, como veremos abaixo.
A decoração com lápis cerâmico introduz uma sensação de proximidade com o utilizador, criando a ilusão de que qualquer um poderia executá-la, como se resultasse do riscar de uma criança. A textura visual deste tipo de grafismo é simultaneamente subtil, delicada e informal, tornando-se sedutora pela aparente fragilidade e irregularidade. 
Neste tipo de decoração de rápida execução, pode constatar-se que a riqueza da pintura manual, por oposição à decalcomania, reside nas suas falhas, pequenas diferenças que conferem a cada peça um carácter único, uma marca humana.




OAL | Olaria de Alcobaça - copos, Anos 60. © CMP


OAL | Olaria de Alcobaça - copo, detalhe. © CMP


OAL | Olaria de Alcobaça - copo, detalhe. © CMP



OAL | Olaria de Alcobaça - copos, Anos 60. © CMP


OAL | Olaria de Alcobaça - jarro, Anos 60. © CMP


OAL | Olaria de Alcobaça - jarro, Anos 60. © CMP


OAL | Olaria de Alcobaça - jarro, detalhe. © CMP


OAL | Olaria de Alcobaça - jarro, detalhe. © CMP


OAL | Olaria de Alcobaça - jarro, detalhe. © CMP


Algumas variações de cores:


OAL | Olaria de Alcobaça - conjunto de jarro e copos, Anos 60. © PMC



OAL | Olaria de Alcobaça - conjunto de jarro e copos, Anos 60. MdS Leilões


Após a Segunda Guerra Mundial, em período de retoma económica e reconstrução da Europa foi necessário criar novos hábitos de consumo, extintos pelos constrangimentos impostos pela Guerra. A publicidade torna-se uma indústria, tomando para si essa missão. À cor e grafismo apelativos alia-se o sentido de humor, todos os recursos são válidos para fazer face à concorrência e afirmar novos produtos no mercado.
Diversas marcas apelavam ao espírito lúdico das donas de casa, publicitando os seus produtos nas revistas femininas, propunham brindes coloridos modernos e funcionais. De produção barata e pouca qualidade nos acabamentos, estes objectos eram muitas vezes desenhados propositadamente, outras aproveitavam linhas já em produção.
Detergentes como o Sunil, o Juá ou o Sonasol, chocolates em pó para misturar no leite como o Milo, o Toddy ou o Ovomaltine, ofereciam como brindes peças utilitárias de vidro, porcelana, faiança ou esmaltes. Estas peças povoaram as cozinhas portuguesas durante anos, tachos e panelas de esmaltes coloridos, louça da SECLA, copos e chávenas de vidro resistente e barato, peças de porcelana que compunham serviços que se iam completando coleccionando cupões ou tampas retirados das embalagens dos respectivos produtos, dados à troca por cada uma das peças.



Publicidade ao leite em pó Pensal, campanha de brindes, Anos 60.



A multinacional Nestlé, detentora de várias marcas de grande distribuição em Portugal, irá adoptar este conjunto produzido pela OAL, como brinde do leite em pó Pensal, um dos seus produtos com maior sucesso.
Acima podemos ver exemplos de publicidade da marca em publicações da época e abaixo reproduzimos um desdobrável da mesma campanha, contendo sugestões de receitas possíveis de executar com este produto e informando-nos que para obter as referidas peças de faiança seriam necessárias "5 tampas e 22$50", no caso do jarro e "2 tampas e 5$00" para cada copo. Assim este conjunto terá sido abundantemente difundido, entrando no lar de muitos portugueses, tornando-se parte do quotidiano e povoando as suas memórias.



Folheto publicitário da campanha de brindes do leite em pó Pensal, Anos 60. © Sílvia Jardim


Folheto publicitário da campanha de brindes do leite em pó Pensal, Anos 60. © Sílvia Jardim


Folheto publicitário da campanha de brindes do leite em pó Pensal, Anos 60. © Sílvia Jardim



Folheto publicitário da campanha de brindes do leite em pó Pensal, Anos 60. © Sílvia Jardim



Como já referimos, estas peças raramente estão marcadas com a sigla OAL, sendo frequente aparecerem sem marca, o que tem causado dificuldades de identificação, gerando equívocos.
Algumas das peças distribuídas como brindes eram vulgarmente marcadas com o nome do produto ou da empresa a que estavam associadas, não estando identificada a fábrica. Assim, neste caso, por vezes aparecem marcadas "Nestlé", como se verifica no exemplar abaixo reproduzido.



OAL | Olaria de Alcobaça - jarro, Anos 60. © CC


OAL | Olaria de Alcobaça - jarro, marca da Nestelé. © CC


Acrescentamos a esta publicação uma peça não marcada, aparentemente da mesma proveniência, já que utiliza o mesmo tipo de pasta calcítica, os mesmos vidrados e decoração a lápis cerâmico.
Uma jarra de formato tronco-cónico arredondado e invertido, com o interior azul, cujo exterior, vidrado a branco, é riscado verticalmente a lápis cerâmico.
Gostaríamos não só de saber a proveniência desta jarra como de conhecer outras peças com as mesma características.


OAL | Olaria de Alcobaça (?) - jarra, Anos 60. © Joel Paiva


OAL | Olaria de Alcobaça (?) - jarra, Anos 60. © Joel Paiva


OAL | Olaria de Alcobaça (?) - jarra, detalhe. © Joel Paiva


OAL | Olaria de Alcobaça (?) - jarra, tardoz. © Joel Paiva



CMP* agradece aos coleccionadores Sílvia Jardim, Catarina Cardoso, Joel Paiva e PMC, a colaboração e cedência de imagens de peças das suas colecções.


6 comentários:

  1. E porque é sempre um prazer aprender mais e mais com a CMP ...Parabéns por mais um valioso texto.
    Sílvia Jardim

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    1. Obrigada Sílvia!
      Espero poder continuar a contar com a tua colaboração :)

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  2. Excelente blog! Gostaria de saber o valor dum conjunto de jarro e copos (6) que se pode pagar numa dos mercados "da rua" em Lisboa, porque não consegui numa pesquisa "Google".

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    1. Caro chr-zei,
      obrigada pelo comentário. É impossível responder a essa questão já que os valores são muito variáveis.

      Saudações,
      CMP*

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  3. Hola, observo afinidades estilísticas con la obra de Heinrich Löffelhardt para Arzberg y de Theo Baumannn para Arzberg y Rosenthal y Martin Freyer para Rosenthal en los años 50-70, por ejemplo: (Colecciones Secunda Athena, Service Form 2025, 5500 Brasilia, 2000, 2075, 449, 411, jarrones de Freyer...).
    Un saludo.

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